Nossa Bruxaria




Escrever sobre Wicca, não é apenas a tarefa simples de descrever nossas crenças e atitudes, mas definir também um posicionamento a respeito do que significa e como vivenciamos estes conhecimentos. Em meio a tantas tradições e formas de praticá-la, podemos dizer que o mais correto seria escrever o que é a Wicca para nós.

Além de uma religião, entendemos a Arte como um modo de viver, interpretar o mundo ao nosso redor, se portar e de opinar. Entendemos o planeta, o homem, a mulher e a natureza como parte da Divindade, portanto, sagrados. Vivemos esta crença 24 horas por dia e sete dias por semana, e não em um lugar, templo, hora ou data específica. Entendemo-nos como bruxos em tempo integral.

Mesmo sendo praticada através de diversos pontos de vista, não acreditamos que tudo possa ser considerado Wicca e que esta é “uma religião livre” por assim dizer. A magia wiccaniana de fato não apresenta figuras centrais, livros sagrados, ou normas rígidas de conduta, mas reúne alguns pontos que são comuns a todos os seus praticantes independente da tradição, ou se este é bruxo solitário ou participa de um coven.

A Wicca é um
sistema mágico que se tornou público por volta da década de 50 através dos esforços de Gerald Brusseau Gardner (1884-1964) que, norteado por conhecimentos obtidos em diferentes sistemas ocultistas e ramificações de
 bruxariadesenvolveu e compilou a base daquilo que conhecemos hoje.

A Arte é considerada também uma religião Neo Pagã - do Latim,
Paganus, que significa “morador do campo”-, pois busca resgatar valores das sociedades pré-cristãs e tem sua filosofia e rituais fundamentados nas práticas agrícolas, pastoris e de respeito à
 Terra iniciadas no paleolítico e neolítico. Alguns autores apontam esta prática como remanesce do antigo culto de fertilidade europeu, o que de fato é uma grande polêmica em nosso meio.

Está no centro de nossa prática, a veneração da Natureza e da Divindade, ambas contendo os aspectos feminino e masculino: A Deusa Mãe em Sua forma Tripla de Donzela, Mãe e Anciã e seu consorte, o Deus Chifrudo.
Há também vertentes que não prestam culto diretamente ao Deus, apenas homenageando-o como Consorte e Filho da Deusa. No entanto, para que distingamos determinado culto como wiccaniano a despeito de qualquer outra forma de bruxaria, se faz necessário o culto à Deusa.

Celebramos
a vida e a morte, entendendo-os como ciclos da vida. Fazemos isto através de ritos de passagem e festivais sazonais conhecidos como Sabaths, onde sacerdotes e sacerdotisas se reúnem para cultuar, meditar, agradecer, dançar, confraternizar, fazer feitiços e se harmonizar. Além dos Sabaths, que são relacionados aos ciclos solares, os Wiccanianos celebram também os ciclos lunares, chamados de Esbaths. Os 8 Sabaths e 13 Esbaths ao ano constituem a pratica wiccaniana mínima.

Somos panteístas, pois acreditamos que a divindade é imanente e estamos imersos, bem como fazemos parte de um grande organismo que é o universo. Para nós as 
Deusas e Deuses presentes em diversas culturas são lentes de aumento poderosas que a humanidade criou ao longo dos tempos para focalizar grandes forças da natureza. Trabalhamos para o renascimento do culto aos Deuses Antigos em diversas culturas, pois consideramos necessário trazer um pulso de energias ancestrais provenientes de um tempo em que humanidade e natureza andavam de mãos dadas e em harmonia. 



No atual paradigma de nossa sociedade capitalista- judaico-cristã, nossa crença se posiciona de maneira contra-hegêmonica ao questionarmos diversos pontos do sistema atual. Somos contra o modelo linear de desenvolvimento econômico vigente, que apenas visa o lucro em escala exponencial, passando por cima de comunidades e ecossistemas. Combatemos a normatização castradora do patriarcado, que promove o machismo e o preconceito, gerando culpa, feridas e violência contra homens e, sobretudo às mulheres. Nós entendemos o aspecto feminino como sagrado já que em nossa crença é a Deusa a mãe de tudo o que há no universo, portanto, cabe a nós os esforços para eliminar todo o tipo de mentalidade que desvalorize a mulher, as suas escolhas e ímpetos.

Em nosso meio é inadmissível qualquer tipo de preconceito e discriminação, seja ela por etnia, cor, crença, gênero ou orientação sexual, pois tudo é parte do corpo da Deusa e todos os tipos de pessoas e comportamentos são a expressão sagrada da Divindade.

Dentre nossas práticas, existe também a Iniciação, algo que todos os praticantes devem realizar para se tornarem sacerdotes de fato. É um compromisso assumido perante a Deusa e Seu Consorte, não importando se isto é feito de maneira tradicional, como é no seio de um Coven, ou por Bruxos solitários (mesmo isto não sendo aceito por tendências mais conservadoras, é a realidades de milhões de praticantes no mundo).

Temos como norma o chamado Conselho Wiccaniano: “Faze o que quiseres se a ninguém prejudicares”. Uma regra de conduta extremamente simples, mas que deve ser rigorosamente seguida e que se relaciona com à metáfora da Lei de Retorno Universal, a chamada Lei Tríplice. Esta é uma forma de compreender o retorno energético que recebemos por nossos atos: respondemos três vezes por tudo aquilo que fazemos perante o universo. Os wiccanianos atraem naturalmente estas leis para as suas vidas, pois elas servem como um lembrete de que devemos agir com responsabilidade ao acessar o poder dos Deuses Antigos.

Para os wiccanianos, tudo o que fazemos influencia o todo, tudo está interligado e é parte corpo da própria Deusa. Sendo assim, assumimos uma postura que não só visa a harmonia pessoal, mas também com os demais. Isto implica na defesa de uma conduta que não agrida os seres humanos e a natureza, por isso não fazemos sacrifícios animais em nossos rituais. Mesmo assim, apoiamos a liberdade dos cultos de matriz africana que o fazem, pois entendemos que isto é feito com respeito e no contexto de uma tradição ancestral.

Trabalhamos com magia natural e transformamos a realidade do cotidiano naquilo que desejamos canalizando energias oriundas de outras esferas da realidade. Justamente por isso, o significado da palavra
Wicca está ligada a palavra saxônica Witch, que significa dobrar, moldar ou girar. A segunda origem é relativa à raiz germânica da palavra Wit, que significa saber ou sabedoria. Portanto, deduze-se que Wicca pode significar moldar a sabedoria. É neste conceito que reside sua essência: moldar (adaptar e utilizar) o conhecimento universal em próprio benefício, sem prejudicar a ninguém. 

Na Wicca a magia é chamada de feitiço não sendo necessária a intervenção dos Deuses Antigos, já que podemos realizá-las a partir dos elementos da Natureza: Terra, Ar, Fogo, Água e Espírito (entendido como a centelha de divindade que a tudo permeia). É possível ser wiccaniano somente cultuando os Deuses Antigos, no entanto como diz Starhawk, “A magia é o ofício da bruxaria” e deve ser usada, sobretudo na transformação e aprimoramento de quem a utiliza.

A reencarnação também é algo que está ligado à nossas crenças, mesmo sendo encarada de maneiras diferentes. Há wiccanianos que crêem retornar como animais ou plantas e outros que preferem a visão mais clássica de retorno à vidas humanas. Em suma, a reencarnação para nós, nada mais é que o fim de um ciclo que prenuncia o começo de outro.

Por fim, não aceitamos a pratica de proselitismo dentro da Wicca, não vemos como obrigação atrair hordas de praticantes, assim como não nos assoberbamos acreditando que aquilo que fazemos é o que há de melhor e mais correto perante a Divindade. Não nos é permitido convencer outras pessoas a deixarem suas crenças para juntarem-se a nós, apenas nos cabe esclarecer quando somos perguntados. A Wicca é uma escolha, uma opção de amor que só pode ser assumido voluntariamente perante o chamado da Deusa.

Filipe Almeida.

Bibliografia:

CERIDWEN,Mavesper CY.
Wicca Brasil: guia de rituais das deusas Brasileiras, Gaia 2003.


GRIMASSI, Raven. Enciclopédia de
WICCA e Bruxaria, São Paulo: GAIA, 2004.

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